Entrevista com o Prof. Dr. Julio Cesar da Rocha

  • Por que você decidiu cursar química?

Eu fiz ensino médio integrado ao curso técnico de análises clínicas lá em Curitiba-PR. Isso me levou, naturalmente, a cursar Farmácia. Durante o curso de Farmácia acabei descobrindo que gostava mesmo de química! Ainda assim me graduei em Farmácia Industrial e então ingressei no Curso de Química da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mas certamente tudo teve início numa feira de ciências, ainda no ensino fundamental, onde fui apresentado a um experimento de eletrólise…


  • O que mais lhe motivou a escolher esse curso?

Redescobrindo a química percebi, já no ensino superior que queria, além de mudar de carreira, me tornar um cientista… e todo químico, bacharel ou licenciado é, antes de mais nada, um cientista!


  • Qual foi sua trajetória até aqui?

Cursei Farmácia Industrial na Universidade Positivo (2005), depois fiz o Bacharelado (2010) e o Mestrado em Química (2013) na UFPR, ambas instituições localizadas em Curitiba. Cursei o Doutorado em Química (2018) na Universidade de São Paulo (USP), São Paulo-SP. Fui orientado pelos Professores Fábio Souza Nunes e Ronny Rocha Ribeiro no Mestrado e pelo Professor Henrique Eisi Toma no Doutorado.


  • Comente sua experiência em pesquisas e projetos de extensão.

Nunca participei de projetos de extensão… o que é uma pena pois é parte fundamental da nossa formação! Em relação a pesquisa venho me engajando desde o curso de Farmácia (trabalhando com estabilidade de fármacos) e depois na graduação em Química, desde o ano de 2007 até o fim do doutorado, trabalhando com química inorgânica.


  • Comente sobre sua pesquisa de doutorado.

O resultado final do meu projeto de Doutorado, como em boa parte dos casos, é diferente dos objetivos iniciais… Num primeiro momento a ideia era usar o ranelato de estrôncio, um composto de coordenação usado no tratamento da osteoporose, como sonda para análise de metais pesados em baixíssimas concentrações usando espectroscopia vibracional Raman e o efeito SERS (Surface Enhanced Raman Scattering) na superfície de nanopartículas de ouro (AuNPs). Mas nem tudo são flores… os resultados não vieram, o sistema se mostrou mais complexo do que o previsto e, no final, a tese defendida foi sobre os aspectos fundamentais da química dos derivados do ácido ranélico, especialmente estudos (experimentais e computacionais) sobre a estrutura eletrônica e a reatividade das espécies.


  • Qual a maior dificuldade que você encontrou em sua profissão?

A primeira dificuldade é a não existência de regulamentação da profissão de cientista, tão pouco o reconhecimento da pós-graduação como atividade laboral (“… mas você só estuda?”). A remuneração dos pós-graduandos e a ausência de direitos básicos também dificulta a situação de quem quer fazer pesquisa no Brasil. Por fim a diminuição dos investimentos em educação, ciência e tecnologia nos últimos anos, fruto da crise, da falta de planejamento/gestão e, principalmente, do desmonte do estado pós-golpe de 2016 (imagina o que vem por aí!), criaram uma legião de mestres e doutores sobrequalificados e desempregados…


  • Cabe falar de ética na guerra? Toda guerra já não inclui uma violação ética?

Pergunta complicada! Primeiro precisaríamos discutir e chegar a um consenso (se é que isso seja possível) sobre a legitimidade das guerras.  Estas fazem, infelizmente, parte da história do desenvolvimento da humanidade. Sem nenhum juízo de valor (aqui), a existência delas parece ser uma manifestação da natureza humana. Os conflitos entre grupos rivais por território, e tudo que este significa, são comuns em outros grupos de animais. Todavia, a evolução do Homo sapiens (talvez devamos reavaliar esse nome…) nos fez desenvolver, para além das habilidades físicas e cognitivas que nos diferenciam no reino animal, tecnologia e conhecimento suficiente para transpor a barreira dos instintos (que jamais podem ou devem ser usados como justificativa para a barbárie). A filosofia nos trouxe a ética que é, grosso modo, o estudo do conjunto dos valores morais. Cada sociedade, e cada época, tem um conjunto de valores morais que a define… Será que as guerras são moralmente aceitáveis (especialmente no séc. XXI)? Voltamos a questão inicial. Deve haver um mínimo de respeito à condição humana para como o adversário? Sim, deve! Eu, pacifista, socialista, acredito que a guerra em si já é uma quebra do contrato social que temos enquanto espécie. Apesar da excepcionalidade, os conflitos bélicos não podem validar o horror pelo horror, a violência desmedida, a destruição física e psicológica do outro. Deve haver respeito aos direitos humanos básicos nessas situações. Paradoxal… complexo e um bom assunto para o bar!


  • Quais dicas você daria para estudantes que pretendem iniciar a graduação em Licenciatura em Química?

O grande desafio é aprender a estudar. A graduação em uma universidade pública requer uma grande dose de esforço pessoal e auto-didatismo, por melhor que sejam os professores. Nada substitui o livro e nossa relação com ele. Aprender a estudar (não há um método universal) é fundamental!


  • Quais dicas ou comentários que você poderia deixar para os acadêmicos do curso de Licenciatura em Química?

Resiliência e perseverança. O curso não é fácil, mas o conhecimento agregado ao final da jornada é recompensador! Lembrem-se que vocês serão os futuros professores e cientistas! Esse porvir carrega consigo um peso incalculável!


  • Escreva uma frase/citação que você se identifica.

Deixo um poema do meu conterrâneo Paulo Leminski, o banido que sabia Latim:

En la lucha de clases

todas las armas son buenas

piedras

noches

poemas

Um comentário sobre “Entrevista com o Prof. Dr. Julio Cesar da Rocha

  1. O prof. Dr. Julio fez parte do nosso Departamento de Química da UDESC durante alguns anos. Hoje está fazendo outros cursos para ampliar ainda mais sua formação.Vejam que legal a sua entrevista!

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