O QUE TEM UMA VACA A VER COM A VACINA?

Figura 1 – Aplicação de vacina por Edward Jenner. Fonte: Fio Cruz.

Imagina, morrer sem saber a causa da sua morte ou, ainda, conhecer a causa e não possuir alternativas para evitá-la. Foi o que aconteceu com diversas pessoas durante muitos anos. Entretanto, diante do interesse em aumentar a longevidade, os avanços científicos possibilitaram o desenvolvimento de alternativas para retardar a morte, uma delas a vacinação.

As vacinas estimulam a criação de anticorpos pelo organismo contra um agente infectante, sem antes ter contraído a doença para que o indivíduo, em uma possível exposição ao agente infectante, seja capaz de se defender e impedir o desenvolvimento da doença.

Mas você sabe como surgiram as primeiras vacinas?

Para entendermos precisamos voltar um pouco no tempo. Durante séculos, uma doença atingiu diversos países e foi responsável por devastar muitos povos, atingindo todas as classes sociais e fazendo das crianças suas principais vítimas, a varíola. Trata-se de uma doença contagiosa, transmitida de pessoa para pessoa por meio das vias respiratórias ou por contato direto, ocasionada pelo vírus Orthopoxvirus variolae que provoca sintomas como febre alta, vômito, dores generalizadas, aparecimento de bolhas pelo corpo, podendo ocasionar a perda da visão e levar o paciente a óbito. Sua origem é controversa, mas suas consequências assombraram o mundo inteiro. Com o intuito de controlar a doença, diversas medidas foram utilizadas, dentre elas isolamento, quarentena e a variolização, um método oriental que consistia em introduzir um líquido extraído das pústulas (pus) de um enfermo em indivíduos saudáveis na tentativa de produzir uma doença mais branda que a natural. Entretanto, apesar dos benefícios apresentados pela variolizaçao, os sintomas permaneciam e deixavam cicatrizes no rosto e no corpo das pessoas que receberam o líquido.

No século XVIII, enfim, um método eficaz de prevenção contra a varíola foi desenvolvido. Na zona rural da cidade de Berkeley, na Inglaterra, uma doença semelhante a varíola humana atingia os gados da região, denominada cowpox. Como consequência, ao ordenhar as vacas, as pessoas que entravam em contato com as pústulas no ubre da vaca eram acometidas pela doença, apresentando lesões nas mãos que desapareciam com o passar do tempo, entretanto, era de conhecimento geral entre a população rural que as pessoas acometidas pela cowpox ficavam protegidas contra a varíola humana. Ao observar isso, o médico Edward Jenner, que nasceu em Berkeley em 1749, decidiu se dedicar a estudar esse acontecimento com o intuito de proteger as pessoas da varíola humana.    

Sendo assim, em 1796, Jenner extraiu o líquido da pústula de uma ordenhadora, chamada Sara Nelmes, e o aplicou em um menino saudável, o jovem Phipps. Este apresentou reações leves e não adquiriu a doença, o que significava que a criança estava imune à varíola humana. E assim, a vacina foi descoberta, um método seguro e que combatia a disseminação da doença. O termo vacina deriva do latim vaccinae que significa “derivado da vaca”.

O método de Jenner foi recebido com resistência na época devido a estranheza de se introduzir em humanos um germe de animal. Apesar disso, diante dos resultados positivos adquiridos por Jenner, o método foi ganhando cada vez mais credibilidade, sendo utilizado no mundo todo. No Brasil, a vacina chegou no século XIX, mas foi aceita com ressalvas pela população. Já no século seguinte, a cidade do Rio de Janeiro, antiga capital do Brasil, encontrava-se em um cenário conturbado, sob a presidência de Rodrigues Alves: a população presenciava uma reurbanização da capital acompanhada por uma epidemia de varíola. Diante disso, uma campanha de saneamento, que visava combater a proliferação dessa e de outras doenças que acometiam a população, foi implementada.  A campanha, entretanto, era realizada com autoritarismo sem fornecer informações acerca da importância da vacinação, fazendo com que a resistência à vacinação aumentasse. Então, em 1904, o médico Oswaldo Cruz conseguiu a aprovação de uma lei que obrigava a população a se vacinar através de medidas rigorosas, sendo este o estopim da Revolta da Vacina.

Com o passar dos anos, as estratégias de enfrentamento dos problemas de saúde foram sendo modificadas, as pessoas começaram a receber mais informações acerca da importância da vacinação e, como consequência, a vacina foi sendo aceita pela população, reduzindo os altos níveis de mortalidade por varíola. Apesar das medidas autoritárias, as campanhas de vacinação iniciadas por Oswaldo Cruz forneceram grandes contribuições para esse resultado. Todavia, apenas em 1980, segundo a Organização Mundial da Saúde, a varíola foi erradicada.  

Em virtude dos avanços científicos, novas vacinas foram desenvolvidas, contribuindo para o aumento da longevidade da população, dentre elas as vacinas da raiva, tétano, febre amarela, sarampo, rubéola, entre outras, e, agora, a vacina da COVID-19.  


Referências:

TOLEDO JUNIOR, A. C. C. História da varíola. Revista Médica de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2004.

HOCHMAN, G. Vacinação, varíola e uma cultura da imunização no Brasil. Revista Ciência & Saúde Coletiva [online]. vol.16, n.2, p. 375-386. Rio de Janeiro, 2011.

REZENDE, J. M. À sombra do plátano: crônicas de história da medicina [online]. Varíola: uma doença extinta. p. 227-230. São Paulo: Editora Unifesp, 2009.

VAZ, L. B.; GARCIA, P. C. A descoberta da vacina: uma história de sucesso no combate a grandes epidemias. Faculdade de Atenas. 2017.

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